Fernando Barra abordará o “Futuro do trabalho com IA”

Publicado por: Naiara Fachini | 05 de agosto de 2025

Com uma carreira de mais de 25 anos dedicada à tecnologia e inovação, Fernando Barra é hoje uma das principais vozes no Brasil quando o assunto é transformação digital e inteligência artificial. Fundador da startup Skillplace, professor da Link School of Business, colunista da Nova Brasil FM e autor do livro “Meu Emprego Sumiu”, ele tem dedicado os últimos anos a estudar o impacto das novas tecnologias no mercado de trabalho, especialmente em setores tradicionais como a radiodifusão.

Barra é um dos palestrantes do 27º Congresso Paranaense de Rádio e Televisão e chega com um alerta claro: não estamos apenas vivendo uma revolução digital, mas já atravessamos os primeiros passos da Era Cognitiva, onde a IA não apenas executa tarefas, mas amplia a inteligência humana. Em sua palestra, o especialista mostrará como a IA pode se tornar uma poderosa aliada para emissoras, permitindo desde a automação de processos até a criação de conteúdos personalizados e regionais, sem substituir o papel único do comunicador local, mas potencializando sua atuação. Para ele, o segredo não está apenas na tecnologia, mas na capacidade humana de usá-la com propósito, criatividade e estratégia.

Conversamos com Fernando Barra com exclusividade, confira a seguir:

O que o motivou a estudar o impacto da IA no mercado de trabalho?

Entre 2015 e 2019, eu estava na IBM com a função de apresentar o IBM Watson como ferramenta de IA viável e personalizada para as empresas, mas muitas pessoas me pediam para apresentá-la para outras empresas, até concorrentes, com a justificativa que de que elas perderiam seus empregos e seriam substituídas pelas máquinas. Foi essa experiência que me motivou a estudar profundamente os impactos da IA e da transformação digital no mercado de trabalho, culminando no lançamento do livro “Meu Emprego Sumiu”, em 2019. Ele surgiu depois da observação de como a humanidade sempre se adaptou à mudança no trabalho com novas tecnologias, como na Revolução Agrícola e na Revolução Industrial, e que a Revolução Digital estava causando um impacto semelhante. Meu livro veio para mostrar que o mercado de trabalho está passando por uma grande transformação e muitos cargos existentes hoje serão eliminados, mas a busca por profissionais habilitados para este novo tempo gera uma imensidão de oportunidades.

Você acredita que todos os profissionais, independentemente da área, precisam aprender sobre IA?

Acho que depois da pandemia e da Revolução Digital, a gente começou uma nova revolução, que eu chamo de Revolução Cognitiva. Digo isto, porque entendo que a Revolução Digital já aconteceu. A gente não percebe uma revolução, não tem uma data e hora para acontecer. É uma sequência de fatos que depois olhando para o passado, a gente fala: “Poxa, passamos pela Revolução Agrícola, passamos pela Revolução Industrial, passamos pela Revolução Digital”. Hoje, todo mundo usa a tecnologia para trabalhar de uma forma ou de outra. Costumo dizer que você cria tecnologia, estuda ciência da computação, engenharia da computação e vai criar inteligências artificiais ou softwares ou ainda, você vai usar tecnologia. Entendo que estudar e entender a inteligência artificial é mais do que comum e até inevitável. Tanto para quem cria como para quem usa, embora essa consciência ainda não tenha chegado. 

Então, as pessoas precisarão aprender a usar a IA assim como aprenderam a usar o pacote Office?

Exatamente, durante a Revolução Digital, a gente passou pelo letramento digital. Então, as pessoas tiveram que aprender, o Microsoft Office, a trabalhar com o Word, o Excel, saber imprimir um documento, usar uma ferramenta de colaboração para fazer uma reunião e assim por diante, simplesmente para poder trabalhar.

Agora, vão precisar aprender a usar a inteligência artificial para fazer as atividades do dia a dia. Já temos números mostrando que uma pessoa que usa IA é, em média, três vezes mais produtiva do que uma pessoa que não usa. Se um advogado júnior utilizar inteligência artificial, ele vai continuar sendo júnior. Mas, ele será um júnior três vezes mais produtivo, uma vez que ele faz mais em menos tempo e erra menos do que um outro advogado júnior que não usa IA. Então, do mesmo jeito que a gente passou por esse letramento digital,no qual todo mundo precisou aprender a usar tecnologia digital todo mundo vai precisar aprender a usar uma inteligência artificial para ganhar essa produtividade. 

Como as empresas brasileiras estão lidando com essa transformação digital?

As empresas sempre vem em uma segunda onda. A inteligência artificial explodiu com a popularização da IA generativa. Já temos números mostrando como ela traz uma produtividade muito grande, aí as empresas começam a abraçar. O grande problema que temos agora é a alta demanda e a baixa de profissionais preparados para atender essa demanda. Então, estamos passando por uma fase onde as empresas estão educando os seus colaboradores a usar esta ferramenta. É muito interessante porque até agora, o diferencial competitivo era a tecnologia.

Na Era Cognitiva que estamos entrando, a mesma inteligência artificial que eu uso de graça no meu celular é a que está disponível para o Banco Itaú, por exemplo. O preço de acesso à tecnologia não é mais um diferencial. O diferencial está nos dados das empresas, em como elas conseguem combinar os seus dados específicos com a inteligência artificial para se diferenciar no mercado e nos talentos. 

Investir em talentos a partir da Era Cognitiva é essencial para que as empresas tenham diferencial competitivo. A forma de perguntar, de usar o repertório, a experiência e o que cada um dos colaboradores vai extrair da inteligência artificial será diferente. Então, capacitá-los para eles tenham a habilidade de fazer as melhores perguntas e extrair o máximo dessa ferramenta é o grande diferencial do momento. É o caminho. 

Como vê a relação da IA com o meio rádio?

Existe uma barreira ainda muito grande de entrada. As pessoas colocam que a inteligência artificial vai substituir o rádio. Assim como colocaram que a TV ia substituir o rádio, que a internet ia substituir o rádio, que o podcast ia substituir o rádio. E isso não é verdade. Cada instrumento de comunicação tem o seu papel.

O rádio tem um papel muito importante no regionalismo. Ele entende a cidade dele, o ouvinte e leva a informação e entretenimento para esse ouvinte. Quanto mais personalizada for essa informação e esse entretenimento, quanto mais local ele for, mais ele se diferencia dos demais.

Uma IA não vai saber falar de forma personalizada com o ouvinte do interior de uma cidade do Paraná. Ele não conhece a cultura, o regionalismo que tem lá. Então, o rádio continua tendo esse diferencial.

Agora, podendo produzir esse diferencial, pode-se produzir essa comunicação e esse entretenimento a um custo muito mais barato se ele utilizar ferramentas de IA no dia a dia dele. Então, na construção dos roteiros dos locutores, na construção de um jingle, na personalização das notícias, na pesquisa de mercado, na criação de roteiro musical, jornalístico. Hoje é possível criar uma rádio regional personalizada a um custo muito mais barato do que antes e atendendo de forma muito mais personalizada o ouvinte, se eu utilizar a ferramenta a meu favor.  

Qual foi o maior aprendizado nos seus projetos de transformação digital com grandes empresas?

O primeiro é: a inteligência artificial é uma ferramenta. Ela não é um “Deus”, um atalho ou uma fórmula mágica que resolve tudo. Como pela primeira vez, a gente tá vendo uma tecnologia que substitui atividade cognitiva. Ou seja, ela pensa, ela fala, ela cria, ela produz, e isso ainda é algo místico e mágico para nós. Até agora, até a Revolução Digital, a tecnologia substitui atividade física humana. Agora, a gente está vendo uma tecnologia substituir atividades cognitivas. Isso gera medo e preocupação no ser humano, porque esse era o nosso diferencial e esse grupo de profissionais está se sentindo ameaçado.

Quando eu perco o medo para entender como ela é, percebo que ela simplesmente vai ampliar o meu conhecimento. Vai me dar mais produtividade, eficiência, e até criatividade, mas eu preciso entender como ela funciona para perder esse medo. As pessoas têm medo da inteligência artificial porque não a conhecem. Quando a gente desmistifica, mostra como funciona e a capacidade que essa ferramenta tem de ampliar os meus conhecimentos, os projetos avançam a velocidades brutais.

Que tendências você enxerga especificamente no setor de radiodifusão?

O fato de poder criar roteiros personalizados, de ter uma parte mais prática da rádio que não vai substituir a pessoa que tem o conhecimento específico dos moradores da região. Enfim, mas que resolve toda essa outra parte técnica. O primeiro ponto é a personalização. 

O segundo, o baixíssimo custo de produção com qualidade surpreendente. 

A IA generativa vai ajudar a rádio a ter um custo de criação inferior, porém, com mais qualidade. Então, eu posso criar um locutor virtual com uma voz X e que vai fazer a locução da minha rádio. Posso criar jingles sem precisar ter o custo de estúdio, música.

Mas a criatividade do que vai ser falado no jingle, o texto, eu até posso usar IA para me ajudar, mas ainda tem “um quê” de criatividade de personalização da rádio. Já o custo da criação, que deveria ir para um estúdio, gravar a música e colocar a voz em cima, hoje dá para fazer com inteligência artificial a valores bem inferiores.

Quais dicas você dá para as emissoras que ainda não estão utilizando nenhuma ferramenta de IA?

Estamos no meio de uma revolução sem volta. A questão é: ou as emissoras vão criá-la ou vão utilizá-la. Acredito que elas não precisam criar uma inteligência artificial, mas precisam começar a usá-la e quem não for por este caminho vai ter um custo maior e perder competitividade. A IA é uma ferramenta que pode personalizar e baratear a produção, mas é preciso perder o medo e começar a aprender, seja com cursos ou na prática. 

Implementar IA é uma jornada parecida com contratar alguém novo: no começo, você investe tempo ensinando, revisando, corrigindo. Aos poucos, a IA vai entendendo o público, o estilo da rádio e começa a colaborar com ideias de roteiros, jingles, spots e peças promocionais. Com mais uso e interação, ela evolui e se torna cada vez mais útil e autônoma. Mas esse processo leva tempo, por isso, é essencial começar logo, ou a emissora corre o risco de ficar para trás.

Confira a programação completa do 27º Congresso Paranaense de Rádio e TV.